Governo gastou, apenas em 2010, R$ 30 milhões com o pagamento do seguro-defeso em Minas Gerais
No Bairro Sagrada Família, um suposto pescador profissional seria, na verdade lanterneiro |
Desde 1920 não é mais possível pescar profissionalmente em Belo Horizonte. A pesca tampouco é uma atividade econômica importante em Minas Gerais como é no Rio de Janeiro, em Santa Catarina, na Bahia ou no Ceará. Mas o que não falta no Estado são pescadores fantasmas. São 34 mil com registro profissional, sendo 94 em Belo Horizonte. Todos têm direito a aposentadoria especial e, entre o fim de 2010 e o começo de 2011, quase a metade dessa categoria, mais precisamente 14.895 pessoas, recebeu o seguro-defeso, uma espécie de seguro-desemprego para o período de reprodução dos peixes, conhecido como defeso ou piracema, quando a pesca comercial é proibida.
O Ministério do Trabalho e Emprego informa que, apenas no ano passado, foram gastos R$ 30 milhões com o pagamento do seguro-defeso em Minas. Somente quem vive da pesca pode receber. Um dos documentos exigidos é a carteira profissional de pescador. No Estado, o benefício é pago entre novembro e fevereiro. Cada pessoa recebe, no período, um salário mínimo por mês.
Especialistas do setor dizem que a maior vantagem para os profissionais é a aposentadoria especial. Desde 2008, os pescadores adquiriram esse direito, sendo equiparados aos trabalhadores rurais. Para receber o benefício, têm de possuir a carteira profissional e provar que exercem a atividade há pelo menos 15 anos. Para se aposentar, um trabalhador comum precisa ter 35 anos de contribuição para o INSS, quando homem, ou 30 anos, no caso da mulher.
Para os belo-horizontinos, o local mais próximo e conhecido para a pesca esportiva e amadora é o trecho do Rio São Francisco que abrange a Represa de Três Marias. OHoje em Dia tentou localizar quatro endereços em Belo Horizonte de pescadores registrados como profissionais. Dois não existiam e nos demais moravam as pessoas registradas como pescadores, mas flagrantemente ligadas a atividades profissionais completamente distintas do manejo da rede e do molinete.
No edifício Maleta, na Avenida Augusto de Lima, no Centro da cidade, por exemplo, mora José Bernardo Filho, um pescador de fim de semana, mas que está catalogado como profissional e apto a receber a aposentadoria especial e o Seguro-Defeso. No local, um senhor que se identificou como Oswaldo Bernardo disse que o irmão José Bernardo nunca foi um profissional da pesca. “Ele é desenhista industrial”, afirmou. Oswaldo contou que o irmão não recebe o Seguro-Defeso, mas que “já deu uma de pescador”. “Foi quando nós moramos em Resplendor (a 465 quilômetros a leste de Belo Horizonte). De vez em quando ele pescava”, disse.
Em outro endereço no Centro, na rua Goiás, também consta como residência de um pescador profissional chamado Atajair José de Macedo. Mas o endereço é falso. O número 481 da rua, indicado no cadastro, não existe. Já no Bairro Sagrada Família, na Região Leste, mora Gilson Carlos Luconi. Ele tem registro de pescador esportivo, mas é lanterneiro. Gilson não foi encontrado em casa, porém vizinhos confirmaram que o pescador é, na verdade, um lanterneiro profissional. Em outro caso, Antônio Francisco da Silva, registrado como pescador profissional, não foi encontrado no endereço indicado no cadastro. No local, uma moradora disse que não conhecia Antônio.
Questionado sobre os números, o superintendente da Pesca no Estado, Wagner Benevides, reconheceu que podem existir fraudes, mas há fiscalização para coibi-las. Segundo ele, é natural o grande número de pescadores. Segundo Benevides, os pescadores de Belo Horizonte vão pescar em Três Marias.
'Caixa d'água do Brasil'
Minas Gerais tem mais pescadores artesanais do que os estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo e Pernambuco, dotados de litoral e notoriamente produtores muito mais expressivos de pescado. O último relatório sobre o assunto, do Ministério da Pesca, é de 2009. Na época, os pescadores registrados como profissionais em Minas somavam 20.401. O superintendente Wagner Benevides informou que o número saltou para 34 mil profissionais em 2011.
Também em 2009, o Ministério da Pesca registrou no Rio de Janeiro 18.344 profissionais. No Espírito Santo eram 17.607 e em Pernambuco, 14.452. Na época, a produção de pescado mineira chegou a apenas 18.809 toneladas. Já os cariocas, mesmo com um número menor de profissionais, conseguiram pescar 62.952 toneladas, mais do que quatro vezes a produção mineira. Já os pernambucanos foram ao mar e aos rios para juntar 23.774 toneladas de pescado.
Mesmo diante das evidências, Wagner Benevides não considera os números incongruentes. “Minas é a caixa d’água do Brasil”, afirmou, explicando que o Estado concentra muitos rios e lagos. Segundo o superintendente, além dos cerca de 34 mil pescadores profissionais, Minas Gerais tem 39 mil amadores.
Fonte: Hoje em Dia
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